– O mundo era para ter telhado – Reclamou Estêvão Coivara, sob o sol no meio da colheita de café – Bom mesmo só para o patrão que não planta e nem colhe. Aliás, planta serviço e colhe as benesses.
– E como a chuva ia molhar o chão? – Perguntou o seu compadre, com o rosto inundado de suor e a pele ressecada.
– Abria na hora certa. Pois tudo que é fechado, Deus deixou a hora das aberturas, pode ser qualquer flor, animal ou criatura!
– Bem lembrado. Até a boca é fechada, mas quando se abre, escancara a dentadura – Admitiu o compadre, admirando a sabedoria de Estêvão.
Ainda falavam, quando um redemoinho se levantou distante e trouxe aquela folha amarelada e envelhecida de um jornal e a deixou ali onde estavam. Estevão mesmo colhendo, pôs-se a ler aquela notícia sobre o preço de uma zebra. Abaixou-se, pegou a folha e a pôs no bolso. Aquela notícia caída aos seus pés, feito mensagem do além, tinha lhe remexido o quengo, desconfiou o compadre ao vê-lo silenciar de repente.
Chegando em casa, nem disse que havia chegado para esposa. Atravessou lá para a casinha do quintal. Trazendo um saco de estopa, procurou um pouco, e retirou uma lata de tinta:
– Compadre remexa a tinta branca, enquanto eu procuro a preta.
– E o que vamos fazer, meu compadre?
– Já, já, lhe explico, remexa a tinta, que o senhor vai me agradecer para sempre – E após encontrar a lata de tinta, se pôs a remexer também, revelando a ideia – Vamos pintar o meu burro, igual à uma zebra, e vender amanhã na feira.
– Mas meu compadre, zebra não se parece com burro. Vão desconfiar, homem.
– Alguém aqui já viu uma zebra para saber que é diferente dum burro? O detalhe mora nas listras, só isso. Se quiser parar, pare, mas não diga depois que não pensei no senhor – Vendo que o outro aceitara, mesmo sem estar convencido, se puseram em transformar “Amendoim”. A mulher quase desmaia ao ver a demora e ir até a porta do quintal, mas depois se acalmou.
De manhã cedo quando ninguém ainda havia chegado ainda na feira lá estavam: Estevão, o compadre e a zebra. Até que foram chegando um por um, e boquiabertos espiavam aquele animal nunca visto para aquelas bandas. Então, começaram a aparecer as propostas de compra, mas Estevão disse que animal exótico assim não se vende, se leiloa, e pôs-se a gritar quem “dá mais”. Já no fim da manhã, um cigano dobrou o valor da última propostas e levou o bicho. Estevão recebeu a bolada de dinheiro e apenas lhe recomendou:
– O único cuidado é não banhar este bicho, nem deixar pegar água, que ele descolore e morre.
O cigano agradeceu e logo na primeira cidadezinha em que parou, percebeu que havia comprado um tesouro. Ganhou dinheiro como nunca havia ganhado! Bastava chegar num lugar, armar uma empanada e cobrar ingresso para quem quisesse ver “Um animal exótico, vindo do outro lado do mundo ”!
Um dia o cigano vinha numa estradazinha quando uma chuva desabou de repente. Ainda tentou se abrigar debaixo de uma árvore, mas não adiantou. Viu listra por listra serpenteando pelas pernas e barriga do bicho, até tocar o chão.
Quando encontrou Estêvão na feira, depois de muito tempo, quase não o reconhecia. Parecia um outro homem, até barraca de vender café com erva-doce tinha. Amarrou a zebra sem listra na entrada, e reclamou:
– Estevão repara com ficou a zebra, mas parece um burro.
– Mas eu lhe disse que não podia banhar, nem pegar chuva. E se eu fosse você eu agradeceria, pois descoloriu e não morreu. E pensando bem, não é porque está sem listra, por descuido seu, que não continua uma zebra, né? – Encerrou o assunto, lhe oferecendo uma semente de café com a garantia de frutificar caroços de sabor e tamanho nunca vistos, vindos também do outro lado do mundo

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